domingo, 10 de dezembro de 2017

A Super Mulher e o Passarinho



Como de costume, acordo ao som do despertador. Levanto da cama,ainda com o corpo pedindo mais algumas horas de sono e me jogo embaixo dá água do chuveiro. Não dá tempo para preguiça, o dia é curto demais. Tão curto que mal me sobra tempo para escolher a cor da blusa ou tomar café com ovos mexidos.
Passo pela porta, pronta para sair de casa e olhando para o meu quintal penso: "Meu jardim está sem cor, sei lá, está falando vida. A que lá está, só o faz por teimosia, por insistência, ou quem sabe, por esperança." O dia segue... implacável. E eu fazendo malabarismo entre as horas e minhas obrigações. E nessa, meus ombros doem, me pedem um tempo, mas não posso parar para ouvi-los.
A vida pede muito de mim, ela me quer forte, produtiva, sorridente e ativa, sempre ativa. Cuidar, amar, proteger, prover, ouvir,abraçar, alimentar...De segunda à segunda, muitas horas por dia. Ser inteira para servir, fazer acontecer.
Meu dia está sem cor, a vida um tanto quanto pesada. E eu resisto aos lamentos por teimosia, insistência ou quem sabe, por esperança. As pessoas me irritam, vê-las sorrindo me incomoda. Não lembro mais como é sorrir pra vida,  ela me exige resultados, pro-atividade. E eu digo: "Sim, senhora.". 
Eu, solícita, ansiando para que finalmente, o findar do dia chegue. Meu corpo cansado e minha alma pedindo colo. Meu lar vazio de sentido, de aconchego, de paz. Não é lar, é simplesmente casa, um lugar árido onde recosto minhas frustrações e lamúrias. É só um solo onde me falta tempo para regar.
Tudo que não fui capaz de administrar vai comigo para a cama e de tão rotineiro, já sei onde dorme a preocupação de cada dia. Meus olhos pesam,assim como minha mente que pede sonhos bonitos e coloridos para deixar a realidade menos amarga. Finalmente, durmo.
E tudo recomeça, dia após dia, cansaço após cansaço.
Um pássaro pousou no galho de um árvore que ficava logo abaixo da minha janela. Um ser tão frágil me desafiou com seu canto de liberdade. Ele foi insistente, cantou, cantou, cantou...Até que, em um desses rompantes de rebeldia, surgindo como uma salvação, eu decidi tirar a capa de "super mulher". Me despi da minha armadura, lancei para longe escudo, espada e rancor. Eu queria ser livre também, e cantar, voar, fazer ninho.
Percebi que não era a vida que cobrava de mim era eu que queria ser tudo. Queria abraçar o mundo e assumir minhas dores e as dores alheias. Queria carregar nos meus ombros pesos além do necessário. Percebi que não era a vida que me dominava, era meu ego. Meu orgulho, minha auto suficiência.
E que aquelas pessoas que sorriam ao meu redor não me afrontavam,elas me convidavam para ser feliz com elas. Que elas não falavam para me importunar, mas para me fazer parte de tudo que elas eram e faziam.
Percebi que ergui diante de mim o muro da "obrigação de ser responsável", para não ter que lidar com as imprevisibilidades de se viver sem amarras.
Percebi que querer fazer tudo pelas pessoas e nada por mim não era altruísmo,era auto abandono. E quem recebia meu tudo, não tinha que retribuir de igual forma,nem poderia. Era demais querer que reconhecessem que faço além do que eu deveria, como um mérito.Porque de fato, não é. Demorei para perceber isso.
Hoje não passo mais pelo meu jardim, eu me dedico a ele. Por me cansar de tanto adubar, semear e colher nos quintais que rodeavam lares que não eram o meu. Por me cansar de me fazer tudo para todos e nada pra mim. Não pense que a vida não se tornou mais fácil; Apenas aprendi, que quem escolhe como irá vivê-la sou eu. E escolhi que felicidade também foi feita pra mim.
Obrigada, passarinho.

domingo, 3 de dezembro de 2017

De Lagarta à Borboleta

Ph: via Pinterest
Há muito tempo atrás tive um encontro comigo. Pode parecer estranho, de fato é, mas durante grande parte da minha vida, eu não me conhecia.
Precisei da dor para me enxergar através dos meus olhos e me orgulhar de quem eu era.Precisei do abandono pra aprender a me fazer companhia.Precisei do vazio para aprender a me preencher...
É, não foi fácil (nunca é).
Desse encontro conquistei algo que antes me causava medo: a mudança. Eu tremia todas as vezes que sentia que meus alicerces poderiam ruir, fugia de todo e qualquer movimento que me tirasse do lugar. Queria estabilidade, segurança, sossego. Era meu casulo.
Aos poucos, fui percebendo que estar sempre no mesmo lugar, do mesmo jeito, rodeada pelas mesmas pessoas, não era segurança, era prisão. E a vida começou a sussurrar no meu ouvido: "Vem!". Mas eu ainda queria algo que me trouxesse firmeza aos passos.
A verdade é que sempre fui covarde. É, covarde. Preferia ficar onde não me cabia mais do que arriscar sair e dar de cara com uma possível frustração. E de imaginar não conseguir me adequar ao novo, eu cravava meus pés no chão. Feito mula empacada.
A vida continuou me chamando e eu resistindo. Tinha medo de sofrer. Que ironia. Quanto mais medo eu tinha de sofrer mais eu alimentava minhas feridas e as fazia crescer, e doer. Calava meus gritos até que um dia, não consegui mais fazê-lo.
Me apegava a pessoas, como se elas tivessem o dever de me proteger, de me adequar e em troca eu cuidava delas, carregaria o mundo e as dores de todos nas costas. E eu só queria uma coisa: segurança, a maldita segurança!
A vida não me chamava mais, ela foi me buscar. Feito mãe que diante de nossa teimosia nos pega pelo braço e diz "Não está escutando? Estou falando com você.". E eu tal criança pirracenta, queria ficar, jogava meu corpo no chão, fazia força para não sair do meu conforto. Dessa vez, não adiantou.
Sofri, como nunca imaginei sofrer. Mais do que temia sofrer. E me vi definhar, em sonhos, em objetivos, em alegria de viver...Eu não queria mais, estava cansada. O Nada me abraçou. Me abraçou mas não me confortou. Um incômodo estranho me invadiu. O vazio não era meu lugar.
Eu que tanto me escondi do mundo e dos desafios, agora queria sair, desbravar espaços, conhecer novos sotaques, paisagens e cheiros. Entendi, finalmente eu entendi, o que a vida queria me dizer. Moldes não foram feitos para mim. Fui feita pra ser livre. E esse ímpeto me fez ir, tal como a contração de um parto, a dor do desconforto frente ao desconhecido, me fez querer viver. Nascer para vida.
Hoje, me vejo desejante de transformações, numa ânsia constante por mudança. Quero descobrir todo universo que carrego em mim. Quero gostar de café e querer experimentar todo sabor de chás, quero usar tênis,andar descalço e usar salto agulha. Quero ter uma casa no campo e um passaporte carimbado. Quero amar e poder apreciar minha solidão.
Hoje eu quero tudo, e quero muito, porque aprendi que não preciso caber em lugar algum quando tenho o Mundo inteiro feito pra mim. De lagarta à Borboleta, entendo meus momentos no casulo,contudo, nada me faz mais feliz do que sentir o vento da liberdade em minhas asas.
Sei que nem sempre o céu é meu lugar, que preciso pousar em flores, repousar em galhos, e até mesmo me lembrar de quando era lagarta. Tudo bem, a vida continua acontecendo, e eu também. 

domingo, 26 de novembro de 2017

Reencontro


Fim de tarde, clima ameno, o vento acariciando meu rosto, me fazendo sentir parte dele em liberdade, em leveza em fluidez. Meus passos seguros, o caminhar firme, porém, apressado. Mãos livres assim como o meu coração. Olhar refletindo a vida que renasce a partir daquele momento, o momento que esperei a vida inteira. É assim que eu imagino nosso reencontro. Por um segundo, sem pensar se é certo, errado ou impossível.
Braços abertos, sorriso largo e mãos firmes. Seguro de si e de mim, inteiro para construir o "nós". Você ali, a beira-mar esperando tanto quanto eu por nosso abraço. Abraço que sempre foi nosso elo. Elo que nunca foi quebrado. E ao pé do meu ouvido proferir a frase que faz meu coração sorrir: "Que saudade de você!".
O abraço real, o seu cheiro ali. Aliás, não sei o que tem nele... Você me ganhou com ele,sabia? Com todo teor clichê que a situação me inspira, eu te digo que "seu abraço fazia meu mundo parar". Sorrir, por estar ali, por levar na minha pele um pouco de ti. É como se tudo que eu sentisse ficasse ali, transcrito em cada poro meu.
Uma conversa longa, sentados no chão, daquele jeito largado que a gente sempre teve... Olhar que não foge um do outro, mãos que se amparam, acariciam. Carinho, horas a fio sorrindo, se (re)conhecendo. E a cumplicidade, aquela velha amiga nossa. Posso fechar os olhos e sentir suas mãos deslizando sobre os meus cabelos...
Andar pela rua assim, sem pressa e sem rumo. E daí que anoitecer? As horas não nos prendem, nada mais nos prende. Nem passado, nem saudades, nem medos ou cobranças.Hoje, nosso agora é Amor e ele nos faz livres. Livres pra ser esse querer antes de ser explosão de desejo e de descobrir um desejo jamais explorado por nos dois.
Tocar seus lábios pela primeira vez e beijar, infinitamente, beijar... Dar ao desejo o corpo que insiste em subsistir nas fantasias. Ser sua ao deslizar os dedos por suas costas suadas e largas. Ser sua em cada sussurrar, em cada mordida. Sentir, cada espaço meu preenchido por tudo que é seu. Ver um Amor que nasceu com teu abraço morrer de desejo no seu peito.
Dormir sem medo de acordar com a saudade, sonhar só por teimosia, abraçar a realidade como uma criança ao seu brinquedo favorito. Não temer o ruído do despertador e todos os dias me derreter ao ver seu sorriso me dizendo: "bom dia".
Ter meu melhor amigo, companheiro, cúmplice, namorado. Não precisar dizer ou ouvir "Eu Te Amo" , por carregar em nossa história ,em cada renúncia que fizemos, a certeza disso. Te inspirar canções e escrever pra você. Cantar com você (embora voz não seja seu forte, nem o meu rsrs).
Fim de tarde, clima ameno, o vento acariciando meu rosto... Permaneço,olhos vagos ao infinito, esperando suas mãos tocarem meu ombro e dizer: "Oi, sei que demorei muito tempo mas será que a gente ainda pode conversar?".
O vento traz chuva, a água gelada toca meu rosto.
Acordei.

domingo, 19 de novembro de 2017

Rompimento




Saí de perto de mim.  É sério, o rompimento é definitivo.
Cansei dessa história de brigar e voltar como se não doesse,como se não me importasse com tudo que você faz. Cansei de sempre te esperar de braços abertos ainda que com a certeza de que tudo vai se repetir.

É sempre do mesmo jeito, brigamos, nos ofendemos, prometemos nunca mais falarmos um com outro e pouco tempo depois tudo é esquecido, fazemos as pazes. Um ciclo infindável que me desgasta.
Somos muito diferentes, eu sei. A questão nunca foi essa. Até porque sempre soubemos quem éramos desde o início. Conheço bem suas qualidades mas atualmente, são seus defeitos que me ferem. Reconheço que não sou uma pessoa tão fácil de lidar, sou instável, sou possessiva, falo demais.


Acreditei, durante muito tempo, que esse é o nosso jeito de amar. Que brigas alimentam nosso amor e que reconciliar é a parte mais gostosa dos nossos conflitos. Mas quando vi o quanto doentio isso soa... o quanto dependente isso é, me vi ocupando um lugar que nunca desejei.
Não estou aqui para te cobrar mudança alguma, muito menos para ouvir suas falsas promessas de que tudo será diferente dessa vez. Não estou aqui para pedir que largue tudo por mim, nem que me assuma como parte importante da sua vida. Isso já não faz diferença pra mim.

Isso que a gente vive não é, nunca foi amor. É dependência, agraciar de ego, é carência, idealização... é prazer pelo "Sentimento proibido". Brigar, ofender e não conseguir ficar longe um do outro pode parecer poético mas na vida real isso é doença. Tá me ouvindo: Isso é doença!
Amor a gente nutre com amor, com cuidado dia a dia, com respeito, companheirismo. Amor a gente põe acima da raiva, do orgulho, do egoísmo. Amor cala para não ferir. Quando que a gente fez isso um pelo outro? Nunca. Conversar sobre os problemas, falar sobre o cotidiano, compartilhar desejo, isso é só uma parte do as pessoas chamam de relacionamento, mas sem tolerância e respeito, pode ser tudo mesmo amor.

Hoje eu me liberto dessa relação doentia. E no que depender de mim isso termina por aqui. Não quero nenhum tipo de contato entre a gente, nenhum. Pra que continuar nutrindo algo que não funciona? Perda de tempo. Pode parando, não insiste. Esse não é mais um daqueles momentos que prometo sumir da sua vida,definitivamente e desisto. Você foi e voltou quantas vezes quis, eu também. Agora chega. Se desejamos ir tantas vezes ao invés de enfrentar as dificuldades, significa que nunca nos importamos em construir uma vida juntos.

Vai, dá valor pra o que você tem hoje, para a pessoa que você tem do seu lado porque igual aquela você não acha mais. A propósito, já percebeu que é ela que você ama? Que é ela que você não larga, que não tem coragem de fazer chorar, que nunca gritou ou ofendeu? Já percebeu que ao menor sinal de que ela se afasta você se desespera? Cara, dá valor agora porque quando ela também resolver que aquilo que você oferece é pouco pra ela, ela também vai embora. E ai, o que você vai fazer?

O que você vai fazer com essa sua carência e falta de maturidade? O que você vai fazer quando olhar para o lado e não tiver mais ninguém para te acompanhar. O que você vai fazer quando perceber que quis abraçar o mundo e deixou o amor escapar entre seus dedos.

Eu vou embora por mim, por finalmente entender que viver de idealização não combina com o que eu chamo de felicidade. Eu vou por saber que mereço mais do que ser uma mulher para você "variar" de vez em quando.
Hoje pela primeira vez eu não vou gritar, xingar ou discutir. Faço minha malas em silêncio e levo em cada uma delas o aprendizado de nunca mais vender meu amor próprio por desejo ou capricho. Minha dignidade acordou. As migalhas eu deixo aqui no mesmo lugar, não preciso mais delas
Cresce, menino. Vai ser feliz. Porque é isso que eu vou fazer de agora em diante.

domingo, 12 de novembro de 2017

Medo: Meu Monstro do Calabouço


Esse monstrinho sempre me acompanhou e durante muito tempo o alimentei com minhas inseguranças, complexos, cobranças e opiniões. O medo já me amordaçou, já me paralisou, causou dor,me fez refém. Ele tinha mãos fortes, palavras convincentes, era persuasivo a ponto de fazer com que eu desacreditasse de mim.

Perdi amizades, amores, empregos, oportunidades de mudanças por ouvir esse infeliz sentimento. Por entregar a ele o rumo da minha vida. Parecia auto proteção, cuidado, preservação. Não! Era covardia, era pavor de assumir a possibilidade de não ser tão boa quanto eu gostaria, de não ser tão inteligente, de não ser eficiente no trabalho ao qual me proporia a executar, não ser tão atraente para o outro quanto ele era pra mim. Pavor de assumir o fracasso de não ser a melhor em tudo, assumir que não precisaria disso para ser alguém. De vestir a roupa do fracasso que internamente eu já acreditava que era.

Cada chance que eu me privava de viver, cada oportunidade que eu perdia, cada renúncia que eu fazia ia sufocando minha auto estima. Eu me flagelava emocionalmente, me açoitava com frases do tipo "tá vendo, você nunca vai conseguir. Sempre vai existir alguém melhor do que você." "Você não nasceu pra isso, desiste." E o medo? ele ria, crescia, se fortalecia.

Esse ciclo se repetiu anos a fio. Era como estar com uma ferida aberta largada num mar revolto, cheio de tubarões, a noite. Escuridão, dor e agonia. Três palavras que resumem bem o que o medo fazia comigo dia após dia. Fracasso após fracasso.

O medo fazia comigo... será? Pois é, demorei pra me perguntar isso. "Será que ele é tão forte assim?".
Depois de sofrer até o nosso limite a única alternativa que nos resta é lutar para mudar. Mas como mudar o medo e tudo que ele trazia consigo? Como?

Até que um dia o medo veio para mais uma sessão de tortura e eu decidi não fechar meu olhos e me curvar pra ele. Decidi abrir meu olhos, ficar de pé e olha-lo de frente. Minhas pernas tremiam, a boca secou, o coração em taquicardia. Eu estava de pé encarando meu próprio abismo. Como doeu. Ele se aprumou, de forma imponente como quem dissesse "quem você pensa que é, menina?". Permaneci de pé, trêmula. Ele se foi.

Foi um alento. Percebi que conseguia ficar de pé. Ainda que vacilante, ainda que vulnerável, ainda que frágil. Eu conseguia! Mas o Medo voltou, mais forte, mais feroz. Me derrubou, esfregou minha cara no chão como quem mostrasse que era lá meu lugar. Me senti inútil. Mas estranhamente, ainda queria me levantar, e levantei. Foi uma luta constante, árdua e demorada.

Cada vez que ele me derrubava e eu decidia que queria estar de pé, eu me enchia de mim. Me via tal como era e não como eu gostaria de ser. Percebia que não era tão perfeita como eu gostaria de ser mas era a melhor versão de mim a cada vitória solitária que eu tinha. Até que um dia, finalmente, consegui, fui eu quem esfregou a cara daquele maldito no chão.

Eu venci. E novamente olhei o medo nos olhos. Fortalecida, ereta, coração tranquilo e alma leve. Finalmente, dona de mim e de minhas fraquezas. Livre do meu ego "dodoizinho". Foi então que cheguei perto do meu adversário, sussurrei em seu ouvido: "A partir de hoje,você não me domina mais.Seremos aliados. Entendeu?"

Ele é teimoso, por vezes que me levar de volta ao calabouço. Minhas pernas vacilam, mas respiro fundo e digo. "Se você é teimoso, eu também sou."
Meu monstrinho agora sabe que não é tudo que eu sou, ele sabe que é apenas parte de tantas coisas que posso ser. Sou livre.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Meu Ser Só


Não me olhe assim como seu eu fosse um ser de outro planeta. Tá chocado(a)? É isso mesmo, eu gosto de estar sozinha, as vezes. E isso não precisa ser um problema. Eu gosto, é simples.
Andar pelos cômodos da casa e ocupar cada espaço do jeito que eu quiser(ou não). Ser todos aqueles versos das canções que ouço, ou dos poemas que leio, sem ter que explicar isso ou aquilo. Gosto de poder ser silêncio, simplesmente ser.
Caminhar nua. Nua de alma, mesmo. Não sentir qualquer necessidade de vestir um humor para encobrir emoções. A verdade é que eu gosto da liberdade de morar em mim sem sublocar meus interiores, gosto da liberdade de abri mão de pagar taxas emocionais para morar em corações apertados. Gosto de preencher meu espaços e ser dona de cada poeira acumulada sobre o verbo sentir.
Não precisa argumentar, me chamado de egoísta. Esse adjetivo não me pertence. Eu me pertenço.É disso que eu gosto e ponto. Acho pesado demais nutrir um vazio esperando que o outro preencha, não é certo.
Não pense que sou triste ou individualista. Divido sim, minha vida, a convivência sob o mesmo teto, compartilho canções, livros, filmes e até faço o café. Mas entenda, aqui dentro de mim, quem constrói, destrói ou arruma sou eu! Disso não abro mão nunca mais. Demorei muito tempo para aprender que ninguém pode ser responsável pela mulher que escolhi ser, que as vontades são minhas assim como o preço que tenho que pagar por cada uma delas. Então, nem tente domá-las.
Talvez com tantos "Gosto disso, não gosto daquilo", você me ache um pouco mandona. Longe de mim. Não quero colocar rédea no querer de ninguém quanto mais no seu. Também te quero livre e dono de cada parte sua, de cada emoção, de cada ferida. Te quero inteiro e cheio.
Se parecer demais para você, a porta e todas as janelas estão abertas. As da casa e as do meu coração.
Se parecer demais e ainda assim escolher ficar, as portas e janelas também permanecem abertas. Não quero que pense que minha solidão quer aprisionar a sua. A propósito, eu já falei que o meu coração está aberto também, não é?
Fique a vontade, só não esqueça de tirar os sapatos ao entrar para não trazer poeira de vivências antigas. Isso meu bem, também não tem espaço por aqui.
No mais, tem abraço, tem cuidado e bem querer. Tem afago, tem cumplicidade e tem fogo.
No mais... nos transbordamos.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Abandono a conta-gotas

Imagem via: Pinterest

Não sei se de fato é a perda que causa arrependimento, mas com certeza, é a sucessão de erros que causa a perda.
Ninguém vai embora de um dia para o outro, ninguém (em boa saúde mental) muda de um dia para o outro, ninguém resolve abandonar uma relação sem motivos.
A rotina cansa, mas não desgasta o amor. Acordar todos os dias ao lado de alguém não te faz partir,  dormir chorando pelos mesmos motivos, isso sim. Erros sucessivos, descasos constantes, mágoas reprimidas, sonhos renunciados.
Engolir a revolta e abrir os braços são pequenas doses de veneno a correr no sangue. Impossivel ignorar: Falta e perdão mata,excesso de perdão à  quem nunca se arrependeu, também.
Cuidado, se você se sente seguro demais a ponto de pensar que pode fazer o que for que a pessoa do seu lado vai te aceitar,  te perdoar. A história pode ter se repetido muitas vezes, aí  te digo mais enfaticamente,  cuidado!
E se você é a pessoa que está do outro lado, angustiada por sempre ser magoada e perdoar. Não se culpe. Você acreditou no Amor e isso não deveria ser motivo de vergonha para ninguém. Tem um grito preso no seu peito? Força, isso vai ecoar. Talvez com um berro, talvez com um choro, talvez com o silêncio, talvez com a partida sem regresso... Talvez com a morte de um sentimento.
Não é de um dia para o outro que o amor nasce, deve ser por isso que também não é repentinamente que ele fenece.
Portanto, cuide do colo que te afaga, cuide do abraço que te conforta, cuide do corpo que te aquece, respeite o amor que te dedicam, valorize a alegria que te proporcionam. Para que amanhã ao acordar não haja um espaço vazio na sua cama e uma dolorosa ausência na sua vida.
Agora, se nada disso fizer diferença para você, já não é ao outro quem deva procurar, mas a si mesmo.

domingo, 15 de outubro de 2017

E se


E se tudo tivesse sido diferente?

Se eu não engatinhasse antes de andar. Se não tivesse caído de bicicleta..
Se eu tivesse ganhado o tão sonhado patins...os brinquedos, estojo com lápis de 36 cores.
Se eu não tivesse passado dificuldades, se todos os dias tivesse o  biscoito que eu queria, se todos os dias tivesse carne no prato... Se todo dia tivesse uma casa confortável pra morar.Se eu nunca tivesse adoecido.
Se eu fosse popular na escola. Se eu namorasse a primeira pessoa por quem me apaixonei, se eu tivesse casado com a primeira pessoa que amei.

Se tivesse passado de primeira no vestibular, se eu tivesse um emprego de sucesso ao garantir meu diploma..
Se eu nunca tivesse perdido o amor de ninguém. Se eu nunca tivesse deixado de amar ninguém. Se eu nunca tivesse perdido...Se eu nunca tivesse chorado até pegar no sono, se eu nunca tivesse amado em silêncio, se eu nunca tivesse sentido a rejeição, se eu nunca tivesse rejeitado.

E se tudo fosse diferente?
Se as cicatrizes que eu carrego simplesmente não existissem.
Se quem me enganou, magoou ou mentiu nunca tivesse cruzado meu caminho.

Se tudo tivesse sido diferente.
Eu jamais poderia dizer : 
"Hoje, sou a melhor versão de mim"

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Corda bamba



imagem via: Pinterest



Por vezes a vida nos cobra decisões,nos impõe situações onde nos sentimos frente a uma encruzilhada.Vemos diante dos nossos olhos caminhos distintos contudo, concomitantemente, caminhos que se completam. Renunciar a um deles é perder parte de algo que é importante.
Como é difícil decidir quando nossas costas pesam por carregar cargas além das que deveríamos e a única vontade é correr rumo ao nada. Fugir dos pesos,das cargas,das cobranças,decisões(e indecisões) e viver simplesmente com a alma tranquila.Como é difícil ver que precisamos agir conforme nos foi pre-determinado quando o que mais queríamos era seguir nossas vontades e lutar para realizar cada uma delas.


É difícil carregar em si os motivos de se renunciar um caminho para seguir outro.
Dói ver coisas que mais sonhamos partindo de nossa vida sem que nada possa ser feito a respeito. Dói deixar isso lá atras, no outro caminho, pra poder seguir o caminho oposto.Dói atender a necessidade e não a vontade,dói ter que se desapegar dos sonhos e muitas vezes acreditar que o melhor é deixar de sonhar pra viver pura e somente de realidade.
Dores nos fazem mudar a direção dos passos,decepções,rupturas,medos,mágoas.E quantas forças também nos fazem mudar? mudar de rumo,mudar a motivação e o ritmo desses passos.
A vida não nos dá segunda chance,o que ficou pra trás (sendo importante ou não) não volta mais.É preciso enxergar além de toda essa dor para decidir a melhor direção.


Por mais que a gente tente, é impossível não sofrer. Sofre-se pela mudança,sofre-se pelo que ficou pra trás,sofre-se pelo medo do incerto,pelo desconhecido,sofre-se pela luta interna entre o precisar x o desejar... Seja escolhido qualquer caminho que for é impossível evitar o risco ao erro,não existe escolha sem renúncia...Amor sem sofrimento,Recomeço sem Fim,Distâncias sem Saudades,Afastamentos sem Perdas... E tudo isso dói.

É incerto cada passo. Tropeços podem (e vão)surgir..E o pior,o arrependimento do que ficou pra trás.
Passado, presente e futuro. Pensamentos tortuosos e esperanças bonitas sempre caminhando em corda bamba.


Nessas horas que me dou conta,que nos encontros e reencontros dessa vida (conosco e com os outros),não é só o que vai embora que leva um pedaço de quem fica...quem fica também guarda consigo um pedaço do que se foi.

Por isso que pra Recomeçar em uma nova direção,é preciso Recomeçar no próprio sentido do existir...Renascer e renovar dentro de si a vontade de encontrar nessa caminhada aquilo que acreditamos ser Felicidade.

Até porque depois que descobrimos que podemos voar, o que é uma corda bamba,não é mesmo?


(setembro/2012)

terça-feira, 12 de setembro de 2017

Rascunhando lembretes



Sempre vai ter alguém que nunca esqueceremos.
Apesar da distância, do tempo, dos relacionamentos... O lugar dessa pessoa na sua vida é praticamente inabalável, sabe?
Quando você se sente sozinho é a lembrança do abraço dela que te faz companhia.
Quando você se sente triste é a lembrança do sorriso dela que te alegra.
Quando você se sente sem importância saber que ela fez parte da sua vida te faz sentir a pessoa mais "phoda" do mundo.
Isso ameniza... é um sopro brando pra acalmar o coração naqueles momentos onde você se sente feliz e o vazio de não ter a pessoa contigo para dividir seu mundo.Ou pra quando você ouvir aquele rock anos 90 é a falta dela doer.
Guardá-la nos detalhes do dia a dia é a alternativa para a tristeza não ficar de vez.
Ela é aquele contato no celular que você sabe que matem intacto por medo de reavivar sentimentos que não pode controlar (afinal, tudo que você não que agora é relembrar um sentimento que nunca pôde controlar) ... Essa pessoa é aquela foto nas redes sociais que você olha só pra matar a saudade.
Ela é a lembrança de quem você foi um dia.
É aquele detalhe que você buscou em outro alguém só pra poder se sentir mais perto.
É, existem pessoas que são mesmo inesquecíveis.
Mas a gente continua vivendo como se não soubesse disso.
A gente continua, segue, vive, sorri. Como se não soubesse que uma tristeza sempre estará escondida ao saber que "ele(a) não está mais aqui."

domingo, 20 de agosto de 2017

Onde mora a Saudade



Imagem: Pinterest

No meio da inconstância de seus pensamentos,das incertezas de cada sensação ele se recolhe em si mesmo. Silêncio...E ele se depara com uma caixinha.Observando-a ainda não a reconhece.Tem muita poeira, devido a ação do tempo diante de tudo que precisou ser deixado de lado.
Ele limpa com suas mãos a sujeira que o esquecimento gerou e começa a explorar a caixa.Ele começa a explorar sua própria vida,ou parte dela. Ao abrir a caixa se depara com o primeiro sentimento: A Saudade. Nesse momento,ele já não está no mesmo lugar,agora também está dentro da caixa. E se lembra o porquê dela existir. Lembra que em um momento de loucura (ou desespero) escolheu deixar ali algumas coisas. 

Viu que a Saudade era o que fazia o coração apertar e deixava um certo vazio,uma vontade de pertencer a alguém. Via que a Saudade tinha se transformado na água quente que tocava seu corpo durante o banho, tinha se transformado naquela música que era tão especial pra ele, tinha se transformado no espaço vazio na cama,na ausência de colo quando ele chorava. Ele viu que a saudade tinha se transformado em...ele percebeu que a Saudade não era só um sentimento,ele viu que a Saudade era " ela", a mulher que deixou ir.

Era "ela" o sorriso nos lábios quando as boas lembranças surgiam,era "ela" o pensamento safado que desnorteava e aquecia seu corpo,era " ela" parte de um passado,de uma vida,de uma felicidade...era "ela" aquele sentimento gostoso que trazia paz pro coração. Era "ela" o seu passado presente.

E justamente por isso,ainda que numa caixa empoeirada,ele guardava o melhor de suas lembranças.Porque embora o tempo transformasse o exterior da caixa, ele sabia que pra ele,sempre seria "ela".Embora muitas tivessem sido,e outras ainda viessem a ser."ela" é. E ali,dentro dele,na sua caixinha,isso não mudaria.

Ele sorriu,ainda confuso. Um sorriso frio mas ainda assim,um sorriso.

Nesse momento "ela" era o sorriso,o motivo dele.
Ao fechar a caixinha de lembranças. Um peso invadiu seu coração e  voltou a deixa-la onde estava.Assim que ele a queria,guardada,escondida. Porque se a tivesse em mãos o tempo inteiro,se estivesse sempre diante de seus olhos, talvez não pudesse seguir em frente.

Mal ele sabia que "ela" já era parte de tudo que ele vivia e que a carregaria em cada novo passo,em cada nova escolha.Assim como "ela" sabia que era muito mais do que aquelas lembranças.

E o silêncio vai embora. A vida lá fora continua.
I see you latter...

30 de Julho de 2012.

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Amor de Hotel

Fotografia: Via Pinterest

Era um dia típico, mais um daqueles finais de semana que eu passava fora de casa para participar de algum congresso.
A cama do hotel era mais familiar do que minha cama box... Entre uma palestra ou outra,entre as trocas de roupa e banho, me permitia apreciar a vista pela sacada.
Nessa semana, era notório um movimento a mais. Uma agitação desproporcional as anteriores. Um burburinho. Percebi,mas não fiz questão de compreender a razão pra tanto.
Em meu último dia de estadia, um evento foi cancelado, tive a tarde livre (graças a Deus). Coloquei meu maiô e fui pra sauna relaxar.
'Estranho, a sauna está vazia hoje, que ótimo! Gosto de privacidade' - pensei.
Sento, fecho os olhos grata por aquele instante de tranquilidade.
" Você tem uma toalha sobrando aí?" - Uma voz firme quebra meu silêncio quase meditativo.
" Claro, um segundo, vou pegar pra você" - respondo sem ao menos me virar para o lado.
Quando me direciono para o dono daquela voz, entendi o motivo do burburinho pelo hotel e a movimentação frenética das funcionárias. Era Rafael, um cantor muito famoso no país.
O olhar firme, a boca bem desenhada, cabelo médio,pele clara, sorriso aberto. Pronto, era eu mais uma a ficar encantada pela presença dele. Pude contar com meu auto controle nesse momento para não parecer uma fã idiota.
- "Obrigado...pela toalha." disse ele.
- "... hã... que isso, por nada". respondi.
Ele foi embora.
Voltei para meu quarto pra arrumar minha mala. Pensando no que tinha acabado de acontecer.
- "serviço de quarto"
- "Pois não".
- "Deixaram isso aqui para a senhora na recepção".
Era a toalha que entreguei ao Rafael e um convite para o show que aconteceria na próxima semana.
-"obrigada" respondi ao funcionário do hotel.
Fechei a porta e ao desdobrar a toalha um papel cai no chão. Um cartão. Sutil e direto:
"Obrigado pela gentileza. Te espero na primeira fileira do meu show, próximo sábado." 
O número do celular dele no verso. Nem uma frase a mais.Como a maioria dos artistas, confiante e impulsivo.
Me perguntava como aquela criatura descobriu o número do quarto em que eu estava...contudo, o entusiasmo foi maior  que os "porquês".
Eu uma médica, quase 30 anos de idade, estruturada profissionalmente, emocionalmente desprendida...ali, me sentindo uma adolescente, encantada pela ideia de ter um momento perto dele outra vez.
Saí pra sacada, como de costume. Pego o celular e fico tentada a ligar para aquele número no cartão.
"Posso estar interpretando errado, mais expectativas do que deveria"- penso.
Desci para o restaurante do hotel para jantar. Escolhi uma mesa e me sentei. Peguei o cardápio, decidindo entre massa e ensopados, o que gostaria de comer.
E com as mãos nas costas da cadeira, indicando que vai arrastá-la, ele diz: - "Posso?"
"Claro" - respondo.
E,  novamente, Rafael  sabia onde me encontrar. (Até hoje esse fato é mistério pra mim)
Isso nunca havia me acontecido. Foi uma conversa tão leve. Passamos horas falando sobre a vida como velhos conhecidos. Jantamos, comemos sobremesa, pedimos um vinho. Numa naturalidade assustadora.
"Já está tarde, preciso ir. Viajo amanhã" 
"Eu também, vamos então".
No rol do hotel, sinto as mãos dele na minha cintura. Volto meu corpo para o dele. Frente a frente. Nos abraçamos.
Ele por ser mais alto do que eu, trazia a sensação de abrigo no abraço que eu desconhecia até então. Queria ficar ali pra sempre.
O perfume que vinha dele... forte e marcante sem ser enjoativo. Traduzindo um pouco daquilo que ele trazia em sua personalidade.
Nos beijamos. E era como se meu corpo inteiro despertasse pra ele. Tudo pedia por toque, por beijos, calor...
"Me leva lá pra o quarto, vai" - nunca pensei sussurrar isso tão rápido no ouvido de um homem.
"Eu não tô com pressa" - Disse ele, maliciosamente.
Alguns hóspedes começaram a reconhece-lo e se aglomeraram ao nosso redor.
Escolhemos as escadas, para chegar até o quarto. Embora parecesse o caminho mais demorado era o menos óbvio.
Ele me beijava, e acariciava meu corpo. E nisso, meu corpo levitava pelos degraus. Completamente entregue. Mal podia esperar pelo sussurro no ouvido, pela boca invadindo meu corpo, pelos dedos percorrendo cada centímetro da minha pele, a língua percorrendo minhas cochas...
Paramos na porta do quarto dele, estava entre aberta.
"Estranho, vou chamar o segurança..."
O quarto estava revirado, as roupas dele pelo chão, a cama com todos os pertences espalhados.
Saímos para buscar respostas sobre aquele caos.
Ele me abraçou, me deu um beijo demorado e antes que pedisse pra eu esperar, um suspiro. Ele cai nos meus braços... Me faltavam forças para sustentar o peso.
Vejo um homem passando por nós com uma faca ensanguentada nas mãos. Era o sangue do Rafael naquela faca. A alegria da nossa noite se esvaia naquela poça vermelha no chão.
-"Socorro! Pelo amor de Deus alguém liga para a emergência.. .Pelo amor de Deus".
Fiz os primeiros procedimentos, mas pela gravidade do ferimento precisaria leva-lo para o hospital.
-"Rafael,  fica calmo, eu tô aqui...vai ficar bem, vai dar tudo certo."
 As lágrimas insistiam em brotar dos meus olhos e a voz mal saía.
Era a impotência de mulher unida ao conhecimento profissional.Aquela vida teria poucas chances de ser salva.Tudo escureceu ao meu redor.
-"Não posso desmaiar agora"
De longe ouço o barulho da sirene da ambulância.

Acordo na cama do hotel, ainda confusa. Estava sozinha no quarto. Do lado da cama havia um bilhete.
"Bom dia, dorminhoca, acho que alguém perdeu o voo heim... Já volto."
Parecia uma brincadeira de mal gosto.
Ouço o barulho do chuveiro.Ele estava lá.
"Poxa, pensei que fosse dar tempo de buscar nosso café da manhã antes que você acordasse" - me puxando pra acompanha-lo no banho.
"Você... você está bem!" -sorri dizendo. 
"Claro que sim, Minha Linda". 
O banho durou mais tempo do que o normal... grudei no corpo dele e não queria mais largar.
"O que aconteceu, você está bem?" Perguntou.
"Estou sim, só tive um sonho ruim."
"Esquece o sonho... você já comprou as passagens? Tem um show pra gente ir lembra?"

Nunca me esqueci do sonho.
Mas acordar quase todas as manhãs ao lado dele me faz sentir tanta paz...completute e felicidade que outrora, jamais haviam ousado morar em mim.

*Você deve estar se perguntando onde começou o sonho, onde começou o romance... mas essa é outra história. 




domingo, 6 de agosto de 2017

Recado à Saudade

Fotografia : Fotografos Passarello

Oi, como já somos velhas e íntimas conhecidas, dispenso formalidades.
Na verdade, te chamei aqui porque precisamos conversar. É, isso mesmo, discutir a relação.
Entendo sua importância, não me entenda mal... não quero ignorar o porquê você nascer e renascer vez ou outra. Mas te abrigar às vezes pesa,sabe?
Você me acorda e dá aquele sopro frio no coração, me faz olhar para o lado da cama e sentir que meu corpo está pela metade.
Você me pega pela mão na rua e me faz perceber que os meus passos são vagos, assim como meu pensamento ao horizonte.
Você me abraça forte, me esmaga, quando me deparo com uma foto, canção, perfume no ar...
Você me esvazia por dentro e inunda minhas lembranças. Quer ocupar cada uma delas.
Eu sei que o Amor te mandou aqui como mensageira, como companheira,mas poxa, pega leve.
Você me coloca no colo no fim da noite, se esconde no travesseiro para regar minhas lágrimas e como forma de alento, me traz o encontro em sonho.
Mas o Sol rompe a janela. É dia outra vez, e você já está ali, me encarando, tocando meu rosto com a brisa do vento. Você não me deixa e quando tenta, te chamo. Solidão não é uma boa companhia para o Amor.
Tento te ludibriar com mensagens, ligações,"sinal de fumaça"... Mas não, você não se contenta, sempre quer mais... e finca suas raízes em mim.
Sei que você leva um pouco de mim pra outros ares.. e a propósito, muito obrigada por isso, porém, vou te confessar.
Saudade, você só é boa mesmo, quando morre no abraço do reencontro.

domingo, 30 de julho de 2017

Ecos

Crédito da imagem: Arte de viver 
Vivemos tempos estranhos, onde ser feliz  (ou melhor,parecer feliz) se tornou indicativo de status social... Nada contra a felicidade, por favor, o que quero dizer é que demonstrar felicidade parece mais importante do que de fato ser.
Já reparou como anda as redes sociais? Fotografias bem cuidadas, efeitos, brilho, cor... sorrisos largos e claros, pele impecável, corpo em ordem. Ai você,  reles mortal, com filho chorando querendo mamar, cabelo por lavar, depilação por fazer começa a se comparar com aquilo.
"Nossa, queria ser feliz como aquela pessoa. Ela acabou de parir e tem a cintura mais fina do que a minha aos 16 anos, é esse marido dela, o meu não chega aos pés. Prazer em trabalhar? Como se vivo para pagar as contas?" Ou "Nossa, com um carro desses, uma mulher gostosa, carteira cheia eu seria O cara".
Cada pensamento é um "maldizer" e ecoa pela vida, vai ressoando na mente, nos filhos, na casa, no companheiro (a), no trabalho. E tudo se transforma em pequenos fardos.
O valor da vida medido através do sucesso da vida de outra pessoa, o valor da vida medido pelos sonhos não alcançados.
E onde está a possível causa do problema? Ingratidão, orgulho, ignorância, falta de amor... -Não que isso seja uma verdade absoluta, podem ser inúmeras outras coisas.
A gente não pára para agradecer. Não tô falando de postar nas redes sociais um textao. Tô falando de bem dizer a vida, sorrir para o dia mesmo quando ele insiste em contrariar nossas expectativas. Tô falando de olhar para as pessoas que amamos e sentir aquele calor no peito na certeza de que elas são provas do cuidado de Deus. Tô falando de gargalhar mais e julgar menos.
Toda vez que você reclama de uma dificuldade você mata uma oportunidade de crescer. É aquela velha frase: nada é em vão.
Toda vez que você reclama das bênçãos que recebe todo dia, é como você disse se "isso não tem valor pra mim".
Sua vida pode não ser do jeito que você sonhou, a minha também não é.
Mas saiba, reclamar não vai tornar as coisas mais fáceis.
Não estou dizendo que quando houver dor,tristeza,fracasso, é hora de sorrir e dizer "Ah, como sou feliz!". Estou dizendo que acreditar que todo dia nublado passa, é trazer o sol mais pra perto.
Ecoe para a vida o bem que você carrega. O mal não suporta pessoas assim.

domingo, 23 de julho de 2017

Partidas

Fotografia: Arquivo pessoal.

Tenho uma relação de amor e ódio com rodoviárias, na verdade, é mais ódio do que amor.
Rodoviárias iludem, trazem a falsa ilusão de que o que tanto esperamos nos acompanhará além do agora e nos rouba no instante da partida.
É o aperto no peito e a lágrima que desce quando a porta do ônibus fecha. -Esteja você do lado de dentro ou do lado de fora. É a vontade de parar no meio do caminho e fazer o caminho de volta.
O que fica é sempre maior do que um abraço comporta, o que vai deixa um vazio maior do que a palavra "Saudade" é capaz de alcançar.
A cada curva que faço na estrada, o pensamento voa pela janela me levando para além das montanhas que me cercam. A paisagem é substituída por todas as lembranças que por não caberem em mim, transbordam pelos olhos.
O Amor que me faz ir é o mesmo que me faz querer ficar, e nesse conflito já nem sei mais o que parte e o que fica. Já não sei onde meu "eu" se completa sem faltar para alguém.
Tenho uma relação de amor e ódio com rodoviárias, na verdade, é mais ódio que amor...
Rodoviárias roubam. Roubam meus sonhos, sorrisos, afagos e beijos.
O cansaço que não incomoda tanto quando o destino já se aproxima e o cheiro de café que já pode ser sentido. O cansaço que não domina quando a conversa precisa ser colocada em dia e o colo de mãe não parece ter fim.
Rodoviárias me roubam de mim, e me devolvem aos pedaços. Fazem a tristeza de partir mais pesada que as tantas roupas que sempre carrego em minha mala.
Tenho uma relação de amor e ódio com rodoviárias.
Mas ai de mim... se não fossem elas.
Trazendo de volta o que me falta, me levando aos cantos que me completam... Abrigando os meus, numa espera de horas infinitas.
Recebo nelas, os sorrisos e abraços que me fazem esquecer porque as odeio tanto.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Metamorfose

Crédito da arte: Silvia Pelissero.

Sempre fui do tipo de pessoa que as pessoas costumavam chamar de "transparente". Era fácil saber meu estado emocional só de olhar para mim. O indicador principal, meu sorriso.
Pode parecer um pouco exagerado mas era assim que eu agia, na verdade eu me derramava. Intensa, no sorrir e no chorar. Não tinha essa história de "não é lugar pra isso"(ainda que tivesse meus momentos de choro solitário).
Lembro bem de um dia em especial que me marcou bastante:  uma confraternização de despedida - se é que posso chamar assim- de um amigo muito querido que eu tinha. Eu chorava, mesmo, aos soluços, do começo ao fim, os olhos inchados, vermelhos, em todas as fotos que tirei naquele dia. Não me importava com quantas pessoas estavam ali olhando para minha cara de boba, de maquiagem destruída... Eu só queria que aquela dor de alguma forma fosse embora, e ela queria ir embora pelos meus olhos. Fazer o que?
Era uma coisa bonita em mim. Era... Por estar conjugando o verbo no passado você já deve estar imaginando que algo mudou né? Sim, muita coisa mudou.
Os sorrisos ficaram mais comedidos, as lágrimas muito mais, recolhidas pela maior parte do tempo pela fronha do travesseiro.
A mudança só vista de uma forma bonita nos filmes americanos quando as soluções surgem do nada e tudo fica lindo. A mudança só é bonita quando pensamos na lagarta que se transforma em borboleta. Será que alguém pensa no que ela sentiu em cada etapa? O que custou ter seu par de asas coloridas?
Ainda não me vejo borboleta mas conheço bem o casulo. Talvez pelo tempo, maturidade, dores, traumas ou tudo isso junto. Esse amontoado de coisas lapidaram minhas atitudes de uma forma incontrolável. Quem me conheceu "na forma mais ingênua" que eu apresentava, hoje, me questiona: "Você está diferente". Uns dizem que sou mais forte, outros que estou mais fechada, ou mais fria, mais seca, insensível, e por aí vai.
Não sei como aconteceu. Só sei que quando a dor chega eu me fecho. Sabe a planta carnívora? Pois é, tipo isso. Eu engulo a dor, e quanto maior ela for, mais eu mergulho em mim mesma, mais eu me afasto do mundo ao meu redor. Aquela necessidade de gritar as dores a espera de que me pegassem no colo, foi embora depois que eu aprendi que se eu não descobrir como me curar, ninguém mais vai.
Por mais que tenhamos pessoas ao nosso redor, viver é solitário. Se a alegria chega, me visto dela e não faço questão de sair fazendo festa.
Viver é solitário, não é egoísta, entenda.
Em cada emoção que temos, somente nós podemos vivenciá-las, é impossível querer que alguém mais passe por isso conosco.
Um grito que alguém dá com você, vai doer de um jeito que só você sabe... Um beijo, vai unir seus pedaços de um jeito que só você saberá... Um abraço, traz o aconchego que só você pode sentir.
O que para alguém é só um incomodozinho,para você pode ser sofrimento.
Não dá pra padronizar emoções.
Músicas, textos, atitudes...nada consegue transpor o que é exatamente que você está sentindo.
E foi isso que eu aprendi. Só eu sei do que se passa dentro de mim, só eu sou responsável por isso.
Pensa que é fácil? não é. "A menina sorriso", simpática, espontânea, dos olhos que sorriem... virar silêncio. Mas é assim. A vida transforma a gente naquilo que precisa ser.
Sim, da saudade de algumas coisas. Principalmente, daquela mania de ver o lado bom em toda pessoa, em toda situação, de confiar primeiro e só desconfiar se tiver motivo.
Saudade passa, de tudo, até do que fomos um dia.
Ando de mãos dadas com o orgulho de saber que independente do que carregue em meu coração, o faço da melhor maneira que posso (ou consigo) e que sobrevivo as inconstâncias de ser mar revolto ou calmo, com o velho sorriso no rosto. Mar você sabe como é. Tem dias que você pára só pra olhar, em silêncio. Tem dias que ele te chama para mergulhar.
Isso não é pra qualquer um.

segunda-feira, 3 de julho de 2017

À Esposa

Fotografia: Coockie Peste.
Oi, acho que você sabe quem eu sou, não é? Pelo menos sei que já ouviu falar de mim...
Nunca nos conhecemos mas em algum momento de nossas vidas tivemos nossas "intercessões".
Não estou aqui para falar disso, reabrir antigas feridas, nem acusar ninguém.
Só quero poder fazer algo que venho ensaiando a muito tempo.
Eu quero te pedir perdão, por tudo, mesmo.
Você não conhece o meu lado da história e acredito que pouco se interesse por isso também.
Salvos os detalhes sórdidos que não vem ao caso, quero que considere o fato de que embora eu soubesse da sua existência, eu nunca soube que você era "a esposa". Pra mim, você era apenas uma "ex namorada inconformada com o fim de um relacionamento." (pelo menos foi esse o discurso que ouvi e acreditei).
Eu não sei como tudo aconteceu, não sei. Só peço que me perdoe se um dia eu representei a cisão de uma família, ou o atrito de vocês. Se eu representei horas em que um pai faltou para um filho... Se eu fui a desculpa que fez você chorar sozinha no seu quarto. Se fui a ligação ou SMS escondidos. Se eu fui o carinho,atenção e respeito que te faltou. Se eu fui o pensamento distante dele. Se fui teu abandono... Me perdoe.
Cada possibilidade dessas foi remoída em minha mente a cada dia que eu descobria algo sobre vocês.
Você nunca me conheceu, não imagina como o meu caráter é algo inegociável. Mas diante das circunstâncias, talvez nunca acredite nisso. É a outra te falando que é uma boa pessoa, que não quis te fazer mal, que não quis trazer tristeza para sua família... (quem acreditaria nisso?)
Como mulher eu sei o que é passar por isso, e nunca quis estar exercendo o papel de amante (ainda que nunca soubesse que estava fazendo).
Ele sempre soube o tipo de mulher eu que sou, talvez por esse motivo nunca tenha me contato a história de vocês completamente.
Como eu disse, minha intenção não é reavivar nada nem me explicar para você.
Só quero que saiba que desde o momento que eu soube que vocês eram casados eu nunca mais admiti qualquer tipo de contato direto ou indireto.
Não guardo mágoas de ninguém, nem sequer sei a história completa, só vivenciei parte dela ( e não desejo isso pra ninguém).
Acredito que hoje estejamos bem. Você reestruturou sua família e eu daqui vivo minha vida dignamente.
Moça, espero que depois de ler tudo isso você tente modificar a imagem que tem ao meu respeito, que ao invés de ser "aquela vagabunda" você olhe pra mim só como uma pessoa imperfeita que até certo ponto foi ingênua.
Desejo mesmo, de coração, que você seja feliz.
Que eu seja "uma fase esquecida" por vocês, e se não for possível, que você se lembre de mim com a maior empatia possível. Afinal, não sou sua rival, nunca fui. Espero que um dia entenda isso.
Minhas dores eu carrego sozinha e o aprendizado que tive com elas também.
A vergonha de ter representado tudo que eu abomino, isso já não carrego mais.
Essa é minha libertação.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Saber sofrer

Fotografia: desconhecido 
A partir dessas conversas que a gente tem com alguém no dia a dia fiquei pensando a respeito do sofrer.
E o que é a tristeza? Antagônica a alegria somente? Uma força,um sentimento,um estado emocional,uma resposta a certa circunstância?
Ouve-se tanto a respeito do entristecer-se,do isolar-se. Ouve-se tanto que é errado chorar,ficar triste,se recolher em si mesmo,calar...Por parecerem esses gestos atos de fraqueza.
Mas afinal o que é ser fraco? É sentir dor,é chorar,é ter saudade,é errar? Ser fraco é cometer erros e se arrepender? É sentir-se pelo menos uma vez na vida incapaz de dar um passo adiante por sentir a tristeza como algo maior que a si mesmo? Ser fraco é ser resiliente e não demonstrar o que entendem por certo para demonstrarmos?
O que é SER humano nos tempos de hoje,onde ser superficial e expor uma vida que não existe é mais importante do que viver de fato? Se permitir sangrar, chorar,morrer por dentro e renascer quantas vezes for preciso, é demais?
Porque é tolido ou supervalorizado quem expõe a dor? Não seria a tristeza tão comum a nós como a alegria,a fome,o medo,a saudade?
Tenho a sensação de que os sábios sofrem em silêncio,não por serem egoístas mas por entenderem que pra todas as coisas existe um tempo e que o tempo de sofrimento é algo que por muitas vezes se dá do corpo pra dentro e não ao contrário. O que advém do corpo pra fora nada mais é do que defesa, uma das tantas maneiras de tentar se libertar.
Sofrer em silêncio, não é esconder a dor; E simplesmente entender que por ser algo tão singular merece ser vivido da mesma forma.É deixar a tristeza vir e passar como um vento num dia de tempestade.
Alguns ventos só balançam as folhas das árvores,outros arrancam algumas pelas raízes mas independente da força ou do tamanho de sua devastação,os ventos se vão.
Alma é lugar por onde passa a dor,não lugar pra ela se instalar.
Tenho aprendido que o mal não está em sofrer,mas está na acomodação, na terrivel mania que temos ,as vezes, de apresentar essa dor a cada um que se aproxima de nós. O mal está em "dar alimento e abrigo pra dor pra que ela fique de vez dentro de nós".
Chorar é uma linguagem da alma,acredito nisso,mas discurso repetitivo é vão.Assim como as palavras, lágrimas também tem sua funcionalidade devida.
Será que vale a pena sofrer? Quer saber? Vale sim porque é aprendizado, porque é crescimento,porque faz parte da vida.
Sofrer é uma escolha? Não. E uma condição, acredito.Procurar sofrimento ou permanecer sofrendo sim é uma escolha.
Escolhas...É...nos deparamos todo dia com elas.
Taí, talvez seja esse o fio da meada.Talvez um pouco complexo. Só vivendo pra saber.
Viver é tão simples que chega a ser a coisa mais complicada que fazemos.

29/12/12

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Nossa finitude

Fotografia: desconhecido

Temos em nós o desejo da eternidade e é sobre ela que construímos muitos dos nosso alicerces.
Vivemos como se a chance de ser feliz estivesse frequentemente atrelada a possibilidade de um amanhã. O amanhã idealizado não chega e a chance de ser feliz mais uma vez é prorrogada.
Nos enganamos talvez pelo medo da finitude e das consequências ou pelas expectativas exageradas que construímos, ou pior, aceitamos que o outro "despeje" sobre nós.
São sonhos engavetados em prol de algo que pode não chegar. É um ideal de perfeição que dia após dia ofusca a visão do óbvio: amanhã não existe.
Seu sonho não vai se realizar porque você insiste em posterga-lo, você não será mais feliz assim.
A oportunidade de conhecer alguém interessante passa, porque fica pra amanhã se envolver, já que hoje tantas outras coisas podem vir a acontecer.
A oportunidade de crescer profissionalmente passa, porque fica pra amanhã enfrentar o medo de sair da zona de conforto.
A oportunidade de conhecer um lugar diferente passa, porque fica pra amanhã dizer não para a família e amigos que dizem que precisam de você por perto o tempo todo.
A oportunidade de se conhecer melhor passa, porque fica pra amanhã dizer sim para si mesmo e enfrentar um "eu" longe do idealizado.
A oportunidade de ser feliz passa, porque fica pra amanhã enfrentar o medo do desconhecido.
No fim das contas, a vida pertencerá a quem for atribuída a prioridade. Seus desejos nunca serão seus se o que importar for satisfazer expectativas
A única coisa que você terá por toda eternidade é a si mesmo.
Viver as vezes dói, como tem que ser. Isso é aprendizado, é crescimento. Viver dói mas também ensina.
O que somos hoje se vai,somos finitos no dia bom ou no dia mal e essa é a boa notícia: passa, tudo passa.
A questão é: como você vai escolher passar por cada momento da sua vida? Esperando pelo amanhã para ser feliz ou com gratidão, vivenciando o hoje da melhor maneira possível?

segunda-feira, 19 de junho de 2017

O dia que a paixão morreu

Fotografia: Desconhecido.


Em um dia desses, fim de tarde, enquanto caminhávamos de mãos dadas pelo parque e falávamos dos nossos planos para o futuro, um casal adolescente sentado em um banco próximo a nós se olhava de um jeito familiar. Eles se olhavam como se o mundo se resumisse a estar ali, um diante do outro e nada mais fosse necessário. Eles se tocavam como se não houvesse sensação mais gostosa que aquela, o coração acelerado, a pele quente, a boca sedenta.
Enquanto você você falava do móvel que queria colocar na sala de estar, e da cor da parede do escritório da nossa casa nova, eu pensava "onde foi que a gente perdeu o tesão de se ter..?". Deu saudade de sentir o corpo tremer pelo simples fato de cogitar um encontro, de sentir você me desejar pelo olhar, de sentir seu toque desbravador. Senti saudade de ser a prioridade do seu dia, seu primeiro desejo da manhã.
Senti saudade de sentir o "frio na barriga" e sorrir sem motivo pela rua, de ouvir uma canção e pensar o dia todo em você. Mas não disse nada. apenas sinalizei com a cabeça que concordava com sua escolha de uma decoração sóbria e uma TV grande para a sala.
Continuamos caminhando até chegarmos em casa; Você foi para para o computador trabalhar, e eu fui para cozinha preparar o jantar. " Uma massa simples e um vinho para acompanhar, talvez... ou um assado... uma salada leve." - pensei.
- Amor, vamos tomar um vinho hoje?
- Tenho que entregar esse projeto amanhã, não posso me dispersar. Fica para a próxima. ( e um beijo amigável na testa).
O jantar foi monossilábico. Enquanto eu tentava estabelecer uma conversa, você com os olhos vidrados na tela do computador, jantava apressadamente, mal me respondia, isso quando era capaz de me ouvir.
Te convidei para o banho... Você disse que estava cansado e precisava terminar o trabalho, que eu poderia ir sozinha e me deitar. A madrugada seria longa e cansativa.
Me lembrei novamente do casal no parque. E me perguntei se eles também se transformariam em uma noite monótona de filmes solitários ou uma leitura até o sono chegar.
Meu celular toca, era trabalho. Uma reunião com um cliente novo, uma possível parceria para minha empresa.- "Ótimo, boas notícias. Quem sabe esse ano a viagem para o exterior e a segunda lua de mel sai". - Marcamos para as 14h do dia seguinte.
Chegando ao local combinado, algo estranho ocorreu, aquele rosto não era estranho, o novo cliente, não era um total desconhecido, era o chefe do meu marido. Nos vimos poucas vezes em festas da empresa ou algum evento social que fosse necessário a cordialidade.
Ele me recebeu com um aperto de mão, e disse que o interesse dele era criar uma parceria da minha empresa com a nova empresa que ele estava criando, para que o filho direcionasse. Por isso ele não estava sozinho, havia um jovem com ele.
Acertamos os detalhes necessários e fechamos o acordo. Parecia vantajoso para ambas as partes.
Voltando para casa, tentei ligar para meu marido para contar a novidade, mas o telefone estava ocupado. Mais tarde ele mandou um SMS avisando que chegaria atrasado para o jantar.
Atraso que durou 3 horas. O jantar esfriou e meu entusiasmo também. Cansei de esperar e fui me deitar.
Na manhã seguinte,notei que ele estava deitado ao meu lado, ainda com as meias com que foi trabalhar.
Levantei, preparei o café da manhã. Ele levantou, me deu o beijo na testa de todos os dias, e tomou um gole de café puro, já pronto para o trabalho novamente.
Meu celular tocou... " Alô, precisava te ver hoje, surgiu uma nova ideia para nosso trabalho juntos". Era o filho do patrão.
As ligações e encontros de trabalho foram se tornando cada dia mais frequentes. Ele tinha uma sede pelo sucesso, admirável. Não queria favorecimentos por ser filho do dono da empresa, queria conquistar o seu lugar. Me ouvia em cada opinião, reconsiderava suas ideias e adequava as minhas sugestões, discordava quando necessário, sem perder a doçura.
E nesse ponto, querido leitor, você já pode imaginar o que aconteceu, não é? Sim, a atração surgiu. Era inevitável não desejar tocar na mão dele o tempo todo, sentir o perfume, desejar o beijo e o que aquela boca poderia fazer.
O problema é que o desejo não era unilateral, ele dava sinais de que também sentia o mesmo. Mas respeitoso como sempre foi, exitava em agir.
A cada encontro de trabalho que tínhamos eu chegava em casa cheia de culpa, afinal, amava meu marido. Decidi que contaria para ele tudo que estava acontecendo, ainda que ele decidisse pela separação.
Foi difícil encontrar um tempo com ele para podermos conversar. Quando tínhamos, ele queria sexo, e eu cada vez queria menos.
Enfim, conseguimos falar sobre o que estava acontecendo. Chorei, arrumei as malas, e ele em silêncio. Foi desesperador, esperei por gritos, acusações, mas ele simplesmente se calou.
Enquanto eu arrumava as malas, eu me lembrei da primeira viagem que fizemos juntos, do quanto a gente queria estar ali, da expectativa em conhecer novos lugares... Me lembrei do beijo perto da lareira, das brincadeiras no jardim, do sexo no banho e na cozinha...
Me lembrei do que me fazia querer estar ali com você e do que custou cada dia da nossa história. Das conquistas que tivemos juntos.
Liguei para o sócio, filho do patrão, e marquei um encontro particular. Coloquei todas as cartas na mesa e ainda tomada por um desejo imenso de beija-lo, decidi que não deveríamos nos ver nunca mais, haveria a opção de tratar com meu marido os assuntos referentes a empresa, contudo, isso causaria um mau estar para todas as partes envolvidas. Amigavelmente, o contrato de parceria foi quebrado, sem multas.
Fiquei uns dias na casa de campo que tínhamos. Tirei um tempo para pensar em tudo isso que tinha acontecido.  Eu não tinha dúvida, amava meu marido, porém, sabia que não era mais apaixonada por ele como antes.
Meses depois, nos encontramos para uma decisão definitiva. O frio no estômago estava de volta, só de imaginar que meus dias poderiam não ter mais a presença dele, que os planos para a casa nova seriam cancelados e os filhos tão sonhados, já não correriam no nosso quintal.
Mal conseguimos nos falar, nos abraçamos.
Eu nunca mais quis estar em outro lugar que não fosse nos braços dele, e ele nunca desejou tanto outra coisa que não fosse viver feliz ao meu lado.
Demos as mãos e voltamos juntos para a casa. E naquele banco onde vimos o jovem casal, havia um casal de idosos. Foi aí que eu entendi.
A paixão morreu, para dar lugar a algo imutável. Nosso amor sobreviveu a paixão e decidiu estar vivo pelo simples fato de nos pertencermos além do desejo. 
Hoje, nossas noites não são monótonas como antes, nem regadas a sexo selvagem em cima da mesa... Hoje somos livres para sermos quem quisermos, com a única exigência: Ser Feliz.

quarta-feira, 7 de junho de 2017

Amor torto

Fotografia: Desconhecido.
Oi. Desculpa estar aqui batendo a porta da sua casa tão tarde.
Sei que brigamos e não sou a pessoa que gostaria de ver agora, talvez até tenha outra aí com você (o que eu tô fazendo, meu Deus?). Não precisa me convidar para entrar. Só me escuta, nem que seja pela última vez.
Somos opostos e não sei o que fazer a respeito disso. Eu não sei lidar com seu jeito livre de levar a vida, preciso me sentir seguro, preciso me sentir estável, eu não sei voar assim como você, sem olhar pra baixo, sem medo de cair. Eu não sei lidar com seu jeito intenso de me tomar pra você e depois querer ir embora, eu não sei me entregar sem ser todo seu e te querer preenchendo todos os espaços do meu dia.
Desde o começo, a gente sempre soube que as chances de tudo dar errado entre a gente eram muito maiores do que as de ser feliz.
Essa não é só mais uma briga, não é mais um daqueles momentos em que a gente esquece os gritos e ofensas e resolve tudo em uma noite gostosa.
Nossos mundos não são só opostos, eles se repelem. Essa história de que os opostos se atraem é falácia popular.
Você me destrói.
Calma, deixa eu terminar. Se eu não falar tudo que preciso agora vou ter que conviver com a maldita culpa.
Eu não tô aqui para te dizer porque a gente tá mal, te apontar nossos erros ou diferenças.
Eu tô aqui pra te dizer que você me destrói mas constrói algo melhor no lugar. Que você me faz perder o medo de voar, se estiver do meu lado. Que você me faz vencer meus piores defeitos para querer ser alguém melhor pra mim e pra você.
Tô aqui pra te dizer que outras bocas podem beijar melhor que você, outros corpos me despertarem prazer intenso.. Mas ninguém vai me invadir como você...
Você ta entendendo o que eu falo? Vem cá, põe a mão no meu peito. Tá sentindo? Isso é você, viva dentro de mim.
Não sei se tem mais alguém ai nessa casa com você, se tiver, mande embora. Não precisa me chamar pra entrar. Não preciso de lugar nenhum, preciso de você. E te tomo aqui mesmo, na calçada, pra quem quiser ver.
Meu orgulho se despediu de mim assim que coloquei os pés na sua rua e faço questão de larga-lo de vez.
Eu quero você, tá me ouvindo, só você.
Vem, tá vendo essas mãos trêmulas.. É no seu corpo que elas se firmam.
Eu não quero abandonar a gente. Não quero carregar um peito vazio onde o coração não sabe o que fazer para parar de doer.
Eu não quero meu coração abandonado quando eu sei que lugar nenhum me acalenta como o abrigo que encontro em você.
Você sabe que também está aqui, em cada poro da minha pele.
Pode me mandar embora agora, ou me levar pra morar nessa bagunça que você é. Meu mundo já é todo seu. E se ele ruir a gente constrói tudo de novo.
Não me deixa ir. Não vai também.
Fica.
Não chora. Não precisa falar nada, só me abraça.
Te amo.


segunda-feira, 5 de junho de 2017

Além da Vida

Ilustração: Cliff Nielsen


Chovia só lá fora, mas não em mim. Não dessa vez.
Aqui dentro finalmente um raio de Sol chegou. 

Depois de tanto tempo resolvi tirar o coração do porão e abrir as janelas na esperança de que a vida viesse naquela brisa gostosa que se aproximava.
Chovia, era frio, mas sua voz do outro lado da linha me fazia esquecer os agasalhos. Sua voz me fazia lembrar do aconchego que eu queria desfrutar.
Chovia, mas eu não tinha mais medo. 
Eu finalmente queria ver a mudança de estação, queria ver as folhas mortas se dispersando e aquele amor que você tanto semeou, nascendo.
Talvez a chuva tenha surgido naquele dia para me lembrar o quanto me fiz árida, o quanto me fiz seca...seria o início de um novo tempo.Precisava ser.
Pela primeira vez eu estava inteira no que desejava, queria florescer em Amor com você.
Estava decidida, estava pronta para declarar sua vitória diante do meu coração trancado a sete chaves. Estava pronta para dizer as três palavras que você tanto esperava ouvir de mim e me render aos sonho que me apresentou. 

Era uma página em branco que desejávamos escrever a quatro mãos.
Você foi para outro estado visitar familiares.
Poucos dias separavam nosso reencontro. 

Pela primeira vez o frio no estômago não vinha acompanhado de culpa, eu queria que você chegasse, precisava morar naquele abraço que me protegia do mundo outra vez.
A chuva aumentou, o dia chegava ao fim. A gente tinha que se despedir. Uma música ao fundo trazia a história de um amor além da vida. Com a voz estranhamente embargada, você finalizou a ligação.
"Até amanhã, amor. Chegando em casa eu te ligo. Fica com Deus."
Eu não queria desligar. Meu coração aos pulos,apreensivo, aguardava a manhã seguinte.
4,5,8, 9 da manhã... Sua ligação não acontecia, sua mensagem não chegava. Você também não me atendia. A angústia se instaurou, a cada tentativa frustrada, ela crescia.
Era como se uma mão esmagasse meu coração e estrangulasse meu pescoço, eu mal conseguia respirar.
No meu pensamento, a conversa do dia anterior ecoava ininterruptamente e eu repetia para mim mesma "está tudo bem". "As vezes, o celular está sem sinal, essas coisas acontecem."
Liguei para parentes, busquei notícia suas.
Soube que um carro esteve na sua casa de manhã bem cedo, nada além disso.
No fim do dia, não sabia mais o que fazer, já não tinha esperança de que nada havia acontecido. Liguei o computador e procurei por notícias nos sites jornalísticos, que se referissem ao trajeto que você percorreu. Antes de procurar nos hospitais, consegui o número de um primo seu. 

Telefone toca. Primeiro,segundo toque, e do outro lado da linha um "alô" pesado que já me dizia tudo que eu não queria ouvir, ainda assim eu me identifiquei: "Oi, sou a namorada do seu primo, você tem alguma notícia?" . Uma frase, e tudo ao meu redor desapareceu. " Ele morreu". (alguma coisa naquela voz remetia a sua). Sei que outras coisas foram ditas depois disso mas eu não conseguia ouvir. Quer dizer, eu ouvia mas era só um emaranhado de sons. Meu estado era de torpor,mal conseguia falar. Desliguei o celular.
A angústia agora era justificada. O embrulho no estômago, o frio na espinha, o tremor no corpo, o choro incessante.
Aqui sentada diante desse mesmo computador onde digito essa história, eu recebi a noticia que me dilacerou a alma. Aqui, ainda posso sentir o golpe no estômago,como um soco. - É difícil encontrar as palavras certas.
Perder alguém é doloroso. Contudo, era mais do que perda, era vazio, era inquietação, era culpa. Esperei demais para dizer sim, esperei demais para me permitir amar, esperei demais para dizer o quanto me importava, esperei tanto que não tinha mais a chance de dizer o que sentia. Acabou!

Diante desse turbilhão de sentimentos, lembranças e choro, o verso da canção " Mil vidas de amor, pra continuar, tentar ser feliz sem fazer sofrer, de volta eu sou, eu renasci, pra te merecer...". Não conseguia acreditar que nossa história se resumiria a sonhos não vividos. 
Demorei pra perceber que a vida apresentava chances que não podiam ser adiadas. Que amanhã é tarde demais, que passado é bagagem pesada e muitas vezes, desnecessária. Demorei pra perceber que 'o pra sempre' pode durar um dia só.
Era um peso... Cada lágrima me dilacerava por dentro. Nada que me dissessem, nenhum abraço, nenhum carinho, nada fazia cessar.
Foram dias sombrios.
Me reergui, segui minha vida...Ainda que fosse estranho viver como se você nunca tivesse existido.
Você existia em cada música que eu ouvisse, em cada vez que passasse pelos lugares onde estivemos,em cada conquista que eu tivesse, em cada sms antigo que eu relesse. 

Prometi a mim mesma que não desistiria. Você acreditava em mim, você sempre me viu como uma mulher forte. Eu estava aos pedaços, mas foi a lembrança da sua fé em quem eu poderia ser que me deu forças pra seguir.
Sabemos que a história não acaba assim; Grande parte dela morreu, contudo, isso é assunto pra outra ocasião.
Sempre que penso nesse dia, vejo as cicatrizes, e 
lembro dele como o dia que uma parte bonita de mim se foi. Não sei se ela voltará existir, por hoje sorrio e sigo.
Não chove mais em mim, hoje eu sou a tempestade.
Que descanse em paz.