domingo, 21 de outubro de 2018

Tormenta




Eu sei que não deveria estar aqui com esses meus olhos marejados e essa fala ofegante. Não quero ser um transtorno pra você, mas infelizmente, não consigo mais fugir do caos que se instaurou em mim desde aquele dia em que conheci seu rosto, desde que me vi cativada por seu sorriso .Foi estranho. Desejei morar nele, ser o motivo dele.

Quanto mais desejava,mais sofria. "Não é certo" - como um mantra fiz disso uma armadura.  Porém,  em cada sorriso seu eu me via nua, completamente despida de pudor. Contrariando todas as vezes que prometi para minha razão que a faria prevalecer, pelo bem de todos. (menos o meu)

Não sou assim, inconsequente. Acredite. Moral e honra sempre foram fundamentais para mim. E talvez seja esse o grande problema. Durante muito tempo abri mão de quem eu era e do que eu queria, só para não parecer ser uma qualquer.  Durante muito tempo eu incobri com minhas lágrimas o sorriso de alguém que só me feria. Mas, daí,  quando vi você, senti sua boca me convidar para vida, senti meu desejo renascer, desde então ele grita por liberdade.

Antes de estar aqui, diante de você,  refiz a fala, reconsiderei atitudes, ponderei as possíveis consequências. Antes de chegar aqui, eu lutei contra o fato de já estar presa a você desde o primeiro instante. A culpa não é sua, nem minha, hoje eu sei. Embora ainda me pese o remorso por ter lutado tanto pra sustentar uma felicidade unilateral e repentinamente tê-la abandonado. 

Não é facil, não é. Ou você pensa que toda alegria que você via em minhas fotos eram constantes? Você não tem ideia das dores que camuflei nelas. Você nem imagina o quanto doeu fingir sentir o que não existia mais. Você nem imagina o que me fez voltar a sentir...

Tenho consciência que a angústia pode brotar ao enxergar nos seus olhos o "não " que tanto temo, mas ela seria maior, se eu continuasse a mentir para mim mesma por mais um dia. Ainda que eu não empurre a porta da sua sala e te jogue no sofá, derrame no seu corpo o que arde no meu, ainda que não  invada sua intimidade com minha devassidão, ainda que não sussure no seu ouvido as ordens para me fazer sua. Ainda que nada aconteça, tudo aqui se despeja: minha intenção, meu carinho, meu cuidado, meu medo e meu desejo, que de meu não tem mais nada, desde o instante que seu nome tomou minha boca.

E agora? Vai deixar que seus olhos "raios de sol" invada os meus ou vai me deixar afogar nessa tormenta que é te querer?

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Inocência Perdida



"O Amor perdoa qualquer coisa." Frase utópica lançada ao vento por pessoas que provavelmente não precisaram perdoar alguém que as feriram. Porque na prática, eu e você sabemos, que perdão é uma das coisas mais difíceis de se colocar em prática.  Perdoar dói, antes de libertar, perdoar machuca. Machuca porque tudo que nós queremos fazer quando alguém nos causa dor é revidar.  Ou vai me dizer que quando decepcionam você, a primeira coisa em que pensa é dar um abraço apertado no(a) infeliz e dizer " vem aqui, meu amor te liberta da culpa de ter feito mal a mim ?" Por mais espiritualizados que busquemos ser, não é tão fácil se desprender da dor. Não é.

Queria saber abdicar do meu desejo de sobrevivência emocional, dessa necessidade de me proteger a todo custo das feridas que podem me causar, mas eu não sei. Não sei esquecer com facilidade, não sei entregar nas mãos do tempo a tarefa de cicatrizar o que sangra, não sei sufocar com "eu te amo" o que precisa ser vomitado com um "some da minha vida!". Eu não sei mais negar a mim o direito de dizer "não" ainda que seja reflexo de um ressentimento antigo, uma mágoa pulgente. 

Dizem que não perdoar nos torna amargos, e não consigo imaginar outra possível consequência. É como se derramassem um balde de fel no poço de sonhos que construímos. Pelo menos foi assim que me senti quando, inesperadamente, me vi com esse gosto acre nos lábios. Não dá pra separar doçura de amargura depois que elas se misturam. O amor albugíneo  não vence a obscuridade do rancor. No fim das contas é isso, a gente passa a carregar um pouco de treva quando se vê vítima do engano e a partir de então, inicia-se a luta para que ela não seja maior que o desejo de ser feliz.

Até que enfim, decidimos perdoar, não como uma ação altruísta e milagrosa, mas como reflexo de um anseio incessante de retornarmos ao estado pleno de nada desconfiar. Na verdade, quando decidimos perdoar não desejamos a libertação do outro, buscamos resgatar a nós mesmos, resgatar o que era bom e outro matou. Você sabe, nunca mais seremos os mesmos. Mas quer saber o que nos faz luz ou treva? O desejo de lutar, o inquietante desejo de um dia voltarmos a ser ingênuos e amarmos tal qual uma criança. O que nos faz luz é a lembrança, ainda que distante, da doçura de amar sem reservas e o anseio de nunca perdê-la.