domingo, 25 de março de 2018

Covardia

Ph: Brooke DiDonato

Foi preciso me recolher, me aninhar, retroceder, foi preciso me esconder. Foi preciso me acovardar. 
Eu pensei que a força que continha no meu peito fosse menor do que as rédeas da razão. Quando dei por mim não haviam mais rédeas, e meu desejo desenfreado corria pra você. Ele, livre, não ouvia meus avisos, fingia desconhecer meus conselhos. Me desesperei e corri, corri tanto que minhas pernas adormeceram.

Alcancei a tempo o que poderia me destruir, eu catei o fujão a unha, apresentei-lhe "meia dúzia" de argumentos e fatos; Vi seu fôlego se esvair. Ele chorou. Choramos. Algo em mim queria escutá-lo, algo em mim queimava e queria libertá-lo. Vi minhas energias desvanecendo, a cada soluço. Era uma luta que eu não poderia mais travar sem perder um pedaço meu. E me sentia doer por inteiro.

Agora aqui, recolhida, covarde, sozinha, eu lustro minha armadura, sentindo todo meu corpo pesar, sentindo o vazio gélido me tomar, sentindo meu coração chorar a cada "não" que digo. Foi preciso me render, me deixar inteira nas mãos da razão. Quisera eu, que isso fosse o bastante. Não é. Ao fazer meu desejo refém, aprisionei com ele minha alegria de viver. Desde então, a tristeza pesa mais do que a armadura. Me sinto apodrecer.

Me pergunto se naquele segundo em que meu querer fugiu do olhar reprovador do meu dever, o seu coração ouviu chamar. Se você é capaz de enxergar entre as frestas dessa carcaça que escondo um sentir tão frágil. Se você ouvindo, cogitou atendê-lo. Me pergunto se suas mãos já desejaram me libertar, se sua curiosidade já te fez querer me convidar. Me pergunto se o seu desejo já quis me chamar pra perto.

E me calo...
E choro.
E sofro.

Seu sorriso foi minha sentença. Desde a primeira vez que ele estapeou meu coração, fazendo acordar cada sentido soterrado em desilusões , ficou decretado que a partir de então o que me restaria seria sofrer. Pelo que poderia perder, pelo que nunca poderia conquistar, pelo tanto que eu poderia me perder... Desde então, não importa qual seja a alternativa, o resultado que se apresenta é o mesmo : perda e dor.


Ainda que no fim de cada dia eu ouça meu desejo gritar: "egoísta", ainda que ele não saiba como é difícil mentir pra mim mesma, como é difícil fingir acreditar que sou forte pra seguir... Ainda que ele não saiba que cada anseio meu me leva a libertá-lo, ainda que ele me culpe, eu resisto. Não sei por quanto tempo, resistirei. E cada dia que resisto me perco um pouco mais, me esvazio um pouco mais, silencio mais.

Resisto, fujo, me escondo... te querendo perto, te precisando longe, e quando longe te desejando mais perto. Às vezes, só te quero aqui. Só. Sentindo meu silêncio, me olhando de longe. Às vezes, eu só quero que ouça os gritos que não dou, que entenda minhas fugas, que releve meus ímpetos, que desconsidere minhas pretensões despretensiosas.
No peito o Amor, cansado, sussurra: "Não desiste de Mim, por favor."
Na verdade, eu só queria que você fosse mais corajoso que eu. 

(silêncio...)

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